Nos últimos meses, Varginha tem testemunhado episódios trágicos envolvendo crianças e adolescentes, jovens ciclistas mortos no trânsito. São histórias que, apesar da comoção que provocam, raramente ganham aprofundamento. São tratadas como “acidentes isolados” ou atribuídas à imprudência individual. Mas será que é só isso?
Há muito mais do que fatalidade por trás dessas mortes. Existe um padrão evidente, embora pouco discutido: a convergência entre lazer e mobilidade urbana, sistematicamente ignorada nas políticas públicas. Em Varginha, como em tantas cidades médias brasileiras, o planejamento urbano ainda privilegia o carro, enquanto ciclovias e ciclofaixas são escassas ou inexistentes nas ruas da cidade.
A bicicleta é uma realidade. Seja como meio de locomoção para ir à escola ou ao trabalho, seja como forma de lazer, ela ocupa o espaço público, mas continua invisível para o poder público.
Ainda não estamos debatendo como deveríamos esses atores dentro do cenário urbano, com o compromisso e a responsabilidade que a realidade exige. Ficar esbravejando que é “falta de educação”, “imprudência” ou “incivilidade” não resolve. O debate sobre infraestrutura segura para quem pedala não exclui o debate sobre segurança para quem dirige ou caminha. O trânsito é complexo, envolve múltiplos atores, e todo esforço para ampliar essa discussão é louvável.
Mais do que segurança viária, estamos falando de direito à cidade. De garantir que todos, inclusive os jovens, possam circular com dignidade, segurança e pertencimento. A ausência de políticas públicas voltadas para ciclistas é também uma forma de violência urbana, que silencia trajetórias e limita futuros.
Essa pauta é urgente. E precisa ser discutida pelas famílias, pelas escolas, pelas empresas, pelo Executivo municipal, pela Câmara, pelos coletivos urbanos, pelas secretarias de planejamento e, claro, nas rodas de conversa com os próprios jovens. Porque cada bicicleta que circula por Varginha carrega uma história, um sonho, uma vida que merece chegar inteira ao seu destino.