Coluna | Expressão
Fabricio Serafim
34, é economista e ativista social em Varginha-MG, escreve às quintas-feiras neste espaço, no jornal Correio do Sul (Varginha) e no Jornal do Estado (Pouso Alegre).
Controle de Natalidade, Aborto, Parto Anônimo ou Abandono?
29/01/2008
Em 2007, a Coluna Expressão tratou de diversos assuntos. Polêmicas discussões contribuíram para que refletíssemos sobre temas de nosso dia-a-dia, aprendendo com as opiniões de leitores sobre vários temas. Religião, preconceito racial e sexual, violência, corrupção, política, drogas, esportes, cultura e turismo foram alguns dos assuntos abordados pela coluna. E as participações foram maciças.

Para começar 2008, vamos tratar de um assunto que divide opiniões: As campanhas de contracepção, o direito ao aborto, o projeto de lei que prevê o parto anônimo e o abandono de recém nascidos nas ruas.

Nos últimos anos, inúmeros foram os casos estampados na imprensa nacional. O mais emblemático e que talvez simbolize a urgência de medidas, foi o da garota encontrada dentro de um saco plástico, nas águas da Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte. Porém, muitos outros episódios menos dramáticos foram registrados. Dezenas de crianças encontradas em sarjetas, latas de lixo e portas de residências, de norte a sul do país, trazem à tona a necessidade de que algo seja feito.

O que leva uma mãe a tomar uma atitude assim? Descontrole emocional? Instinto criminoso? Falta de assistência social? E o que pode ser feito para evitar atos desta forma?

Comecemos pela discussão do projeto de lei que prevê a autorização do “parto anônimo”, uma prática já adotada legalmente em alguns países da Europa (França, Itália, Bélgica e Luxemburgo) e também em 28 cidades dos Estados Unidos. Pelo projeto brasileiro, a lei garantiria à mãe que não tem condições de criar seu filho o direito de realizar o exame pré-natal com nome fictício e, logo após o parto, entregar a criança para adoção. Uma modalidade aperfeiçoada da “Roda dos Enjeitados”, criada na França em 1188 pelo papa Inocêncio III, e que funcionava como forma de diminuir o índice de recém-nascidos que eram encontrados mortos às margens do rio Tibre. Instalados nas portas de igrejas e conventos, cilindros de madeira giratórios serviam para que mães deixassem seus filhos em mãos seguras, sem ser identificadas. No Brasil o cilindro de madeira funcionou até meados do século passado, sobretudo nas Santas Casas de Misericórdia do Rio de Janeiro e de São Paulo.

O parto anônimo pretende evitar o aborto ilegal, tantas vezes praticado levando à morte o nascituro e a mãe, dando condições dignas de gestação às mulheres - por vezes crianças e adolescentes -, com uma gravidez acompanhada e assistida pelo estado, dando condição de levar para a adoção a criança, fruto de uma gravidez inesperada ou indesejada, evitando também o abandono em condições desumanas. Talvez, uma questão que deva ser discutida mais profundamente. É necessario ter cuidado, para que não se crie uma espécie de “mercado negro”, em que os bebês se tornem alvo de disputa, já que os pais adotivos têm uma clara preferência por recém-nascidos.

Já as campanhas de controle de natalidade, mais do que uma necessidade social, são também assunto de saúde pública. Método mais conhecido, o uso do preservativo, além de evitar a gravidez, proteje também contra doenças sexualmente transmissíveis. Prática reforçada e novamente posta à baila em época carnavalesca, que este ano vem acompanhada pela distribuição, somente com indicação médica, da “pílula do dia seguinte”. A postura foi adotada pelas prefeituras do Recife e de Olinda, em Pernambuco, sob ruidosos protestos da Igreja Católica e com aplausos do Ministro da Saúde, José Gomes Temporão. "A prefeitura está certa e a Igreja está equivocada", afirmou o ministro, em entrevista após o lançamento da campanha de prevenção à Aids, que vai distribuir quase 20 milhões de preservativos durante o carnaval.

E quanto ao aborto? Tema de acaloradas discussões, a questão beira o fanatismo, tanto por parte dos favoráveis quanto pelo lado dos contrários à causa. Aqui residem argumentos religiosos, científicos e de direito. A partir de que momento um amontoado de células seria considerado um “ser humano”? Em que situações a prática poderia ser permitida? A mãe teria o direito de decidir sobre o próprio corpo e sobre o feto que nele se aloja? O fruto de uma gravidez indesejada não poderia tornar-se um estorvo ou uma futura vítima de abandono ou de ônus para o sistema público de saúde?

No Brasil, mesmo diante de insistentes apelos e de estatísticas consideradas alarmantes, que apontam milhões de mulheres submetendo-se ou praticando em si próprias o aborto, sem nenhuma condição de higiene e segurança, nossa legislação penal só não pune essa prática, quando executada pelo médico, em duas circunstancias: Se não há outro meio de salvar a vida da gestante ou se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu responsável legal. Em sentenças mais recentes, diversos juizes autorizam a pratica do aborto em casos de fetos anencefálicos. Uma dessas sentenças, descreve que "não se está admitindo (...) o propósito de melhorar a raça, ou evitar que o ser em gestação venha nascer cego, aleijado ou mentalmente débil. Busca-se evitar o nascimento de um feto cientificamente sem vida, inteiramente desprovido de cérebro e incapaz de existir por si só".

Associações de mulheres favoráveis ao aborto dizem que “é uma questão de direitos humanos e cidadania. O reconhecimento da competência ética das mulheres para decidir sobre a reprodução é o princípio dos direitos humanos e da cidadania, a possibilidade de que as mulheres exerçam a sexualidade livre de discriminação, coerção e violência, e tenham garantidos os direitos à concepção, à proteção da maternidade, à anticoncepção, e à interrupção de uma gravidez não desejada ou não planejada”. E continuam: “São também direitos sociais, em especial no que se refere ao princípio constitucional de direito à saúde. Isto significa que cabe ao Estado oferecer as condições necessárias para que eles sejam exercidos plenamente. A imposição de que as mulheres levem adiante a gravidez indesejada e a criminalização da sua interrupção, com eventual condenação à prisão quando recorrem ao aborto, desrespeita sua capacidade de decisão autônoma como pessoa e infringe seus direitos à liberdade, privacidade e bem-estar”.

Já os contrários à prática bradam: “Agasalhado na concha do ventre, o corpo de alguém se forma. Alguém despreocupado, confiante, simples, que vive sua vida de sonhos. Aguarda o momento em que verá a luz. Um dia estivemos todos lá, mergulhados nessa cálida inconsciência, aguardando... Por isso, a idéia de uma lâmina que extingue essa vida pequenina nos dói tanto. Há algo mais cruel do que tirar a vida do indefeso? Do que não tem voz? Há coisa mais estranha do que descartar pedaços de gente porque serão mal-formados, deficientes, diferentes? Legalizar o aborto é optar pela exclusão. É criar uma sociedade em que fetos mal-formados ou simplesmente indesejados são descartados.”

A discussão é poderosa! Mas o que se pretende aqui, é tentar chegar o mais próximo possível de um acordo. Contra o abandono, contra a violência e em favor do direito de escolha.

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